A reforma trabalhista teve como um dos seus grandes desafios a atualização do direito material em consonância com o avanço social, modificando artigos defasados (não mais aplicáveis) e criando novos institutos que, antes, não tinham razão de existir. Com esse desiderato, legislou-se sobre o “trabalho intermitente”, que nada mais é do que a regularização do freelance.
Como é sabido, o freelance, vulgarmente conhecido como “bico”, é uma prática muito utilizada pelos brasileiros para auferir renda extra, na medida em que os trabalhadores, em sua maioria, mantêm um emprego fixo e, quando possível, nas horas vagas realizam outros tipos de trabalho.
Assim, o trabalho intermitente caracteriza-se pela realização de trabalhos esporádicos, normalmente, em períodos de grande demanda para o empregador, como, por exemplo: aos finais de semana, feriados e férias. Nesses períodos, portanto, ante a necessidade de aumento do número de funcionários, as empresas poderão fazer uso desta nova modalidade de relação empregatícia para auxílio dos empregados já regularmente contratados.
É a norma, portanto, se amoldando à evolução dos fatos, buscando a segurança jurídica de relações existentes e até então desamparadas. Antes da reforma, para que se tenha de parâmetro, diante da ausência de regra legal, era comum que o empregador mantivesse um número mínimo de funcionários, suficientes para atender a baixa temporada, e, quando próximo ao período de alta demanda, de duas, uma: (i) ou o empregador contratava informalmente “freelance”; (ii) ou ele fazia com que seus empregados se desdobrem para atender a demanda, gerando o desgaste dos trabalhadores e a insatisfação dos clientes com o atendimento.
A realidade acima descrita, infelizmente, ainda é facilmente constatada em bares, restaurantes, hotéis e clubes, visto que todos esses estabelecimentos possuem períodos de alta e baixa demanda; e é, justamente, nesse contexto que o trabalho intermitente se faz uma verdadeira solução jurídica para a realidade fática existente, trazendo um avanço significativo às relações de emprego.
Ante a relevância da criação desta nova modalidade de relação empregatícia, portanto, necessário se faz compreender as minúcias trazidas pela Reforma Trabalhista sobre o trabalho intermitente, as formalidades de sua contratação e os passos a serem seguidos para ter/ser um trabalhador intermitente, o que se passa a fazer.
Em proêmio, é preciso observar que, muito embora o contrato de trabalho intermitente seja solene – celebrado de forma escrita e registrado na CTPS do trabalhador – a prestação de serviços dependerá de convocação. Isto é: ante a necessidade de aumento do número de funcionários em determinada data, o empregador deverá convocar (por qualquer meio de comunicação eficaz), com no mínimo 3 (três) dias de antecedência, o trabalhador intermitente, o qual possuirá prazo de 24 (vinte e quatro horas) para respondê-la, sendo o silêncio corresponde a recusa.
Ressalta-se que a acepção da palavra “intermitente” determina que este tipo de trabalho ocorra de forma não contínua, isto é, com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, independentemente do tipo de atividade das partes, excepcionando-se, apenas, os aeronautas que possuem legislação específica.
O referido período de inatividade, assim, não será considerado tempo à disposição do empregador, de forma que o empregado poderá prestar serviços de qualquer natureza para outros tomadores de serviço, por meio do contrato de trabalho intermitente ou outra modalidade de contrato de trabalho.
Ademais, ressalta-se que, para todo trabalho intermitente, será definido um salário-hora, de forma que sobre este salário proporcional incidirá todos os encargos trabalhista – férias proporcionais com acréscimo de 1/3, descanso semanal remunerado, décimo terceiro salário proporcional e adicionais legais. Nesses termos, ao final de todo período convocatório, o trabalhador terá direito, além da remuneração, ao recebimento das referidas verbas. Além do mais, terá assegurado direito ao recebimento do auxílio-doença (da data início da incapacidade) e salário maternidade, a serem pagos pela Previdência.
Completados 12 (doze) meses do contrato intermitente, o trabalhador terá 1 (um) mês de férias a ser usufruído nos doze meses subsequentes, podendo esta, mediante prévio acordo com o empregador, ser parcelada em até 3 vezes (um período mínimo de 14 dias e os demais não podem ser inferiores a 5 dias) e, durante este interstício, o mesmo empregador não poderá convocá-lo.
Caso decorra 1 (um) ano sem qualquer convocação do empregado – período contado a partir da data de celebração do contrato, da última convocação ou do último dia da prestação de serviços (utilizando-se o que for mais recente) – contudo, o contrato de trabalho intermitente será considerado rescindindo, sendo devidos, pela metade, aviso prévio indenizado e indenização sobre o FGTS, e pela integralidade das demais verbas trabalhistas.
A extinção do referido contrato, ademais, permite que o empregado movimente o seu FGTS, limitado em até 80% (oitenta por cento) do valor depositado, mas não autoriza o ingresso do trabalhador ao Programa de Seguro-Desemprego.
Ressalta-se, por fim, que nos termos da Medida Provisória 808/17, atualmente em vigência, “até 31 de dezembro de 2020, o empregado registrado por meio de contrato de trabalho por prazo indeterminado demitido não poderá prestar serviços para o mesmo empregador por meio de contrato de trabalho intermitente pelo prazo de dezoito meses, contado da data da demissão do empregado”.
Pelo exposto, verifica-se que o trabalho intermitente traz uma série de benesses a ambas as partes da relação empregatícia. Isso porque, se de um lado o empregador mantém uma rede formal de pessoas hábeis a trabalhar na empresa em períodos de maior demanda, bastando sua anuência à convocação; de outro, o empregado terá possibilidade de assinatura de contrato com vários empregadores, aumentando sua possibilidade de convocação e, ainda, recebendo não só a remuneração diária, mas todos os encargos trabalhista devidos, consoante já mencionado.
Dessa forma, não restam dúvidas de que o contrato de trabalho intermitente, ainda que objeto de crítica por alguns estudiosos, é verdadeira inovação jurídica que visa, acima de tudo, regularizar uma situação fática existente no país, de modo que sua aplicação é medida legal e, notavelmente, viável a vários estabelecimentos!
Fonte: migalhas.com.br
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